MOV03191_As Cidades de Israel_Manuel Pedra_Ângelo Ochôa (3).MPG Será que os anjos pisam a terra do pão fluindo ao vento? Se pisam, é assim como se voassem, com sua espécie de ar. Constam de quê? Sopro? Imo trémulo? Só leveza? Velando solícitos subtilezas íntimas indiciam. - Guia-te o sonho o desassombro, aladas presenças sobre pálpebras; com salivado pão te reconheces. - Do crepitante lume: Voltas que dê aqui regresso. E afãs se esvaem. - Desequilibra-se e cai o regente de orquestra. - De bem longe vem, e está à porta, o homem, cabelos brancos, rugas cavadas, testa alta. Traz paz o homem. Deixem-no a caminho até para lá da porta. - Escurecendo a cidade exaustamente, as ruas das casas arrefecem olhos; e afirmam-se nuas as pedras. - Mordi um dos teus cabelos. Vento agora? Sim, porque a noite, sim, porque a manhã. Éramos os dois jovens quaisquer, e os carris precisamente. - O mar nos ouvidos, durmo; se entretanto acordo. - Brando ser, poema pleno, flor leve, breve, à tona de ar, para lá de monte e mar. - Montes dormentes, giestas vergando-se; uma fonte na neve; imensa urze; verdes castanheiros, ouriços carregados. - Entretecido nas pequenas rotinas, tais como barba, banho, café, retomo o fio à quotidiana sequência. - Mulher Mãe todos redime para os braços em sangue do Filho, a erguer-nos dum chão de baionetas. - De hoje em diante, José, a ternura, o esforço, o Abril nítido repetido; até quando, secreto sonho, acordar o enigma a nos matar. - Alegria profunda, eis a verdade, um menino inclinado prà parede. - Som ante a mesa, lisa frieza, manhã jornal, povo espaço, percorrendo-se. - O amante dos tapetes convive com as noites. O apaixonado das águas ressona profundamente. - Adormecida a longa tarde, na chinfrineira do bar me afundo. - Largo de Jesus à chuva dum Verão, distanciando-se a pequena mão da menininha, num aceno ao pai, que resolve pasmos estremecidos. - Pena é que a agenda aponte as emergências, o contínuo divertimento, mas não a determinação - Poesia insinuas, se horror te domina? - Uma, duas flores lilás, num retrato da infância, na carteira de trazer; a lâmpada incidindo na cara entalada, a sombra rodando sobre a mesa; o segmento talhado rigorosamente, o aparo, à amarga indiferença; a nuca é um ponto muito vivo, disse, e voltou-se, o amigo; os braços doem, o psiquiatra é um senhor envergonhado. - ‘He was a friend of mine. He never knew my name.’ Ir a outros dias, sinos tangendo, chilrar dúbio na madrugada, seguir a teimar paz. - Deparando-se com erros sintácticos, sem se importar com a testa, sem literatura, o último poeta evidentemente escreve: Meu país, morto sol, pão exangue, poema exílio, dolorida mágoa, fúria térrea, doido amor, neve ardendo em mãos estafadas. - À sombra de árvore alguém descansa, bambinos sumindo-se pra denro da folhagem. - Dentro, ouço e sento-me; retoma-se a movimentos espaçados a mesma imensa mesa. - A flor nua no ecrã desenrola anti-enredos.
- Deitados na palha, na eira, ao bafo quente daquele Verão, olhos ao céu estrelado, rumávamos a amotinados lumes. - Fazemos uma grande concha, dedos entrecruzados. Os pescadores, por perto, perguntam-nos coisas. Cobrem-nos com redes a tristeza. Trazem-nos dos seus raros caranguejos. - Onde és, além do teu lugar, nem pensando, como abalada. - As rosas brancas beijam-nos inesperadas. - Tanto enlevo termina nos teus dedos. Somente teu olhar irradia dia. - Chuva no alcatrão, alma latejante. Descobri contigo a excepcional prossecução. - A moça me espera, vou levá-la a passear, palavras não contam, conta é viver, não se me atrase o poema. - Sucederem-se abruptas supitâneas esquinas. - Querer bem a torpes aranhões, num oficioso vagabundar - roubassem-nos a casa - ficava o luar - chato o piolho e o cogitar. - Manhã serena, Stockhausen mandado pra debaixo da cama; o céu, igual a uma mulher amodorrada, cadela com o cio. - Tenho para ti que o cinamomo - tronco, tusa, árvore de dificílima declinação - te somes estelar - talvez sim - ou talvez sim - tenho para ti que os concertados gestos… - Damo-nos conta que somos aquém escrito, visto que os maços do tabaco não nos dizem imprimidos os poemas. Embarcações, monte, Viena, Praga, Budapeste, pó, neblina. Confusão ocorre ao explicar como morro enfermo nos teus braços. - Percorres ruas, tristes alegrias resignadas, com os jornais diariamente. - Jarra à roxa luz, recolhimento, na branda mesa enredada renda. - Não vou dizer-te quanto te amo; sabe-lo bem, doutro dia, noutra estrada, a outra hora. Gente seguia sorrindo, cambiando multiplicadas palavras; nós nada dizíamos; íamos, vagueando alegria, atrás do pó. - A esperança de ver-te, se der por isso. Étaix, sábado,
MOV03191_As Cidades de Israel_Manuel Pedra_Ângelo Ochôa (3).MPG
ResponderEliminarSerá que os anjos pisam a terra do pão fluindo ao vento?
Se pisam, é assim como se voassem, com sua espécie de ar.
Constam de quê? Sopro? Imo trémulo? Só leveza?
Velando solícitos subtilezas íntimas indiciam.
-
Guia-te o sonho o desassombro,
aladas presenças sobre pálpebras;
com salivado pão te reconheces.
-
Do crepitante lume:
Voltas que dê aqui regresso.
E afãs se esvaem.
-
Desequilibra-se e cai
o regente de orquestra.
-
De bem longe vem,
e está à porta, o homem,
cabelos brancos,
rugas cavadas, testa alta.
Traz paz o homem.
Deixem-no a caminho
até para lá da porta.
-
Escurecendo a cidade exaustamente,
as ruas das casas arrefecem olhos;
e afirmam-se nuas as pedras.
-
Mordi um dos teus cabelos.
Vento agora?
Sim, porque a noite,
sim, porque a manhã.
Éramos os dois
jovens quaisquer,
e os carris precisamente.
-
O mar
nos ouvidos,
durmo;
se
entretanto
acordo.
-
Brando ser,
poema
pleno,
flor
leve,
breve,
à tona
de ar,
para lá
de monte
e mar.
-
Montes
dormentes,
giestas
vergando-se;
uma fonte
na neve;
imensa urze;
verdes
castanheiros,
ouriços
carregados.
-
Entretecido nas pequenas rotinas,
tais como barba, banho, café,
retomo o fio à quotidiana sequência.
-
Mulher Mãe todos redime
para os braços em sangue do Filho,
a erguer-nos dum chão de baionetas.
-
De hoje em diante, José,
a ternura, o esforço,
o Abril nítido repetido;
até quando, secreto sonho,
acordar o enigma a nos matar.
-
Alegria profunda,
eis a verdade,
um menino inclinado
prà parede.
-
Som ante a mesa, lisa frieza,
manhã jornal, povo espaço,
percorrendo-se.
-
O amante dos tapetes
convive com as noites.
O apaixonado das águas
ressona profundamente.
-
Adormecida
a longa tarde,
na chinfrineira
do bar me afundo.
-
Largo de Jesus
à chuva dum Verão,
distanciando-se a
pequena mão
da menininha,
num aceno ao pai,
que resolve
pasmos estremecidos.
-
Pena é
que a agenda aponte as emergências,
o contínuo divertimento, mas não a determinação
-
Poesia
insinuas,
se horror
te domina?
-
Uma, duas flores lilás,
num retrato da infância,
na carteira de trazer;
a lâmpada incidindo
na cara entalada,
a sombra rodando
sobre a mesa;
o segmento talhado rigorosamente,
o aparo, à amarga indiferença;
a nuca é um ponto muito vivo,
disse, e voltou-se, o amigo;
os braços doem,
o psiquiatra é um senhor
envergonhado.
-
‘He was a friend of mine.
He never knew my name.’
Ir a outros dias,
sinos tangendo,
chilrar dúbio
na madrugada,
seguir a teimar paz.
-
Deparando-se com
erros sintácticos,
sem se importar com a testa,
sem literatura,
o último poeta evidentemente escreve:
Meu país, morto sol, pão exangue,
poema exílio, dolorida mágoa,
fúria térrea, doido amor,
neve ardendo em mãos estafadas.
-
À sombra de árvore
alguém descansa,
bambinos sumindo-se
pra denro da folhagem.
-
Dentro,
ouço e
sento-me;
retoma-se
a movimentos
espaçados
a mesma
imensa mesa.
-
A flor nua
no ecrã
desenrola
anti-enredos.
-
ResponderEliminarDeitados na palha, na eira,
ao bafo quente daquele Verão,
olhos ao céu estrelado,
rumávamos a amotinados lumes.
-
Fazemos uma grande concha,
dedos entrecruzados.
Os pescadores, por perto,
perguntam-nos coisas.
Cobrem-nos com redes a tristeza.
Trazem-nos dos seus raros caranguejos.
-
Onde és,
além do teu lugar,
nem pensando,
como abalada.
-
As rosas
brancas
beijam-nos
inesperadas.
-
Tanto enlevo
termina nos teus dedos.
Somente teu olhar irradia dia.
-
Chuva no alcatrão,
alma latejante.
Descobri contigo
a excepcional
prossecução.
-
A moça me espera,
vou levá-la a passear,
palavras não contam,
conta é viver,
não se me atrase o poema.
-
Sucederem-se
abruptas
supitâneas
esquinas.
-
Querer bem a torpes aranhões,
num oficioso vagabundar -
roubassem-nos a casa -
ficava o luar -
chato o piolho e o cogitar.
-
Manhã serena,
Stockhausen mandado pra debaixo da cama;
o céu, igual a uma mulher amodorrada,
cadela com o cio.
-
Tenho para ti que o cinamomo -
tronco, tusa, árvore de dificílima declinação -
te somes estelar -
talvez sim - ou talvez sim -
tenho para ti que os concertados gestos…
-
Damo-nos conta que somos aquém escrito, visto que
os maços do tabaco não nos dizem imprimidos os poemas.
Embarcações, monte, Viena, Praga,
Budapeste, pó, neblina.
Confusão ocorre ao explicar
como morro enfermo nos teus braços.
-
Percorres ruas,
tristes alegrias resignadas,
com os jornais diariamente.
-
Jarra à roxa luz,
recolhimento,
na branda mesa
enredada renda.
-
Não vou dizer-te
quanto te amo;
sabe-lo bem,
doutro dia, noutra estrada,
a outra hora.
Gente seguia sorrindo,
cambiando multiplicadas palavras;
nós nada dizíamos;
íamos, vagueando alegria,
atrás do pó.
-
A esperança de ver-te, se der por isso.
Étaix, sábado,